19/02/2018 – ‘Pagamento de propina era feito no pátio da Câmara de Suzano’, diz delator de esquema do cartel do café
G1 – Mogi das Cruzes e Suzano
Jamile Santana,
Justiça pediu o afastamento do vereador Denis Claudio da Silva (DEM) e de dois funcionários do Legislativo após investigação do Ministério Público. Segundo MP, foi encontrada fraude em licitação para compra de 1 tonelada de café.
Em acordo de delação premiada feito com o Ministério Público em outubro de 2016, o comerciante César Augusto Silveira Rodrigues, administrador das empresas suspeitas de participar de fraude em licitações na Câmara de Suzano, disse ao MP que o pagamento de propina aos envolvidos no desvio acontecia no pátio do Legislativo ou na sala de licitações.
As empresas geridas por Rodrigues são a Service Mille e Ecomix Eirelli ME, que segundo o MP estão envolvidas em um esquema de fraude para a compra de pó de café para a Câmara. Dois funcionários foram afastados do Legislativo por determinação da Justiça.
O caso tramita na 1ª Vara Criminal de Suzano. A juíza Érica Marcelina Cruz também determinou que os vereadores votassem pelo afastamento ou não do vereador Denis Claudio da Silva (DEM), que na época da fraude era presidente da Câmara. A maioria, porém, votou pela sua permanência, por 10 votos favoráveis e três contrários.
Delação premiada
O acordo de delação premiada foi assinado no dia 24 de outubro de 2016. O MP ofereceu ao comerciante César Augusto Silveira Rodrigues o perdão judicial em relação aos crimes praticados por sua esposa, que no inquérito que apura a licitação do café aparece como responsável pela Service Mille que, na verdade, é administrada de fato, por César.
O MP também propôs redução da pena e fixação da pena em regime inicial aberto, sem pedidos de prisão temporária ou preventiva e de busca e apreensão.
Para ser beneficiado, o delator se comprometeu a identificar todos os autores do esquema, identificar os preços superfaturados e as entregas de produtos em quantidade inferior do que o comprado pela Câmara, além da devolução do prejuízo causado ao órgão público.
Segundo o delator, depois que o acordo era fechado e a empresa recebia o pagamento da Câmara de Suzano pelo contrato, o acerto da proprina era feito no “espaço reservado para o café, na sala de licitações” ou, quando tinha outras pessoas no local, o empresário era levado pelo coordenador do departamento de Compras ao “pátio da Câmara de Suzano” em um local onde “nenhuma das duas câmeras de filmagem instaladas conseguiam capturar a imagem deles”.
Ainda de acordo com o delator, “era um ponto cego” embaixo das câmeras, já que a imagem ali não era gravada”. O dinheiro seria repassado ao então presidente da Câmara, Denis Cláudio da Silva (DEM).
O G1 entrou em contato com o advogado do comerciante e aguarda retorno. O G1 tenta localizar os advogados dos servidores citados nessa reportagem.
O G1 entrou em contato com o vereador Denis Claudio da Silva, mas ele não estava no gabiente na tarde desta sexta-feira (16) e não respondeu ao e-mail até a publicação desta reportagem.
Sobre o monitoramento por câmeras na sala de licitações e pátio, a Câmara de Suzano respondeu que “este questionamento deve ser feito ao titular da acusação”.
Esquema
Segundo o acordo de delação premiada, o coordenador de compras da Câmara, Cláudio César Rodrigues é que recebia o dinheiro do acordo.
Na delação premiada, o empresário detalhou que o coordenador de compras mencionou que “o dinheiro seria repassado ao Presidente da Câmara de Suzano [no caso Denis Claudio da Silva (DEM)]” e que Claudio pedia para que o dinheiro fosse entregue na “mão dele porque ele tem que repassar para Denis”.
O empresário afirmou que nunca entregou dinheiro diretamente para Denis. Veja como funcionava o esquema, segundo o delator:
Cláudio César Rodrigues, coordenador de compras da Câmara de Suzano, fazia a solicitação de compras de produtos e apresentava para a Mesa Diretiva da Casa, cujo vereador Denis Claudio da Silva, era presidente.
Com autorização para comprar, Claudio fazia pessoalmente a cotação prévia dos preços, mas isso era feito apenas com um empresário: César Augusto Silveira Rodrigues.
César apresentava três orçamentos diferentes com três pessoas jurídicas distintas: a Service Mille que está registrada no nome de seu pai; a Comercial Gallmar, dos irmãos Mauro Rogério Gallotto e Leandro Gallotto e a Orion Comercial Eirelli, que pertence a Mauro. César assinava os orçamentos falsos como representante legal das empresas.
Com os orçamentos falsos em mãos, Claudio passava para os integrantes da Comissão Permanente de Licitação quais empresas deveriam ser convidadas a participar do certame.
Dois servidores da Câmara foram afastados por suspeita de participação em fraude de licitação na Câmara de Suzano (Foto: Arte/G1)
Além das três empresas do esquema, eram convidadas empresas que não costumam participam de licitações, além de uma outra empresa da família Gallotto. Desta forma, no fim das contas, só as três empresas do esquema participavam do processo e uma delas seria a vencedora.
Celebrado o contrato, César recebia o pedido de fornecimento do produto e, dias depois, recebia da Câmara. Depois disso, fazia saques em dinheiro de 10% ou 70% do valor do contrato para o pagamento de proprina a Claudio, que repassava para Denis.
Alexandre Gonçalves Pereira, que é da comissão permanente de licitação e responsável pelo almoxarifado da Câmara era responsável pelo recebimento e conferência dos produtos. Ele assinava o canhoto da Nota Fiscal que fazia referência de quantidade bastante superior a que ele estava recebendo.
O pagamento da proprina era feito depois que a empresa vencedora recebia o pagamento da Câmara pelo contrato. César fazia saques e entregava o dinheiro à Claudio, no pátio da câmara ou na sala de licitações.
Este ciclo foi usado na compra de café, na aquisição de alimentos e de cadeiras do novo auditório da Câmara, segundo o MP.
De acordo com a Câmara, os servidores Claudio e Alexandre, citados no esquema, foram afastados do cargo no dia 16 de dezembro, mas seus salários continuam sendo pagos.
Propina
Segundo o empresário, o modelo foi usado em outras licitações. Rodrigues contou que qualquer empresa que pretendesse participar e vencer os procedimentos licitatórios realizados pela Câmara durante a presidência de Denis, especialmente na modalidade convite, era obrigada a concordar em, após a celebração do contrato, pagar os servidores públicos Cláudio César Rodrigues e Alexandre Gonçalves Pereira (membro da Comissão Permanente de Licitação e responsável pelo almoxarifado da Câmara), além do vereador Denis do Mercado, o equivalente a 10% do valor total recebido dos cofres públicos, caso os produtos adquiridos fossem entregues efetivamente na quantidade da nota fiscal.
Se o acordo entre os integrantes da organização criminosa fosse para que os produtos indicados na nota fiscal da empresa vencedora não fossem entregues em sua totalidade, o empresário era obrigado a pagar a Claudio, Alexandre e Denis, o valor equivalente a 70% da quantia que tinha recebido da Câmara.
No caso do café, por exemplo, ao longo de 2016 foram solicitados à empresa 650 quilos, mas foram entregues, efetivamente, apenas 390 quilos, de acordo com o Ministério Público. O empresário César ficou com 30% do valor dos 260 quilos do café que não foram entregues. Os outros 70% teriam sido divididos entre os servidores e o vereador, que ainda teriam recebido 10% referentes aos 390 quilos que foram entregues.
A empresa Service Mille, vencedora do certame, vendeu para a Câmara cada quilo do café por R$ 27,30.
Posições
O G1 entrou em contato com o advogado Sebastião Gomes de Oliveira Júnior, que representa o comerciante César no acordo de delação, mas até o momento não obteve retorno.
Em nota, a Service Mille informou que a empresa atua no mercado há mais de cinco anos, “sempre prezando pela idoneidade e pelo respeito às instituições, sem que jamais houvesse qualquer fato desabonador. Quanto a investigação citada, esclarecemos que estamos colaborando com a justiça e esperamos que o mais brevemente tudo esteja esclarecido e resolvido.”
Já a Ecomix afirmou em nota que é uma empresa regularmente constituída há mais de seis anos. “Nossa atuação sempre foi pautada na ética, honestidade e respeitando as leis e instituições.Em relação à investigação objeto da matéria, esclarecemos que estamos colaborando com a justiça e com as autoridades. Confiamos que tudo será esclarecido o mais brevemente possível”, informou em nota.
O G1 tentou contato com o empresário Mauro Rogério Galloto, da empresa Orion Comercial Eirelli ME, mas não conseguiu.
Por telefone, o advogado Dirceu do Valle informou que contra o vereador Denis não há nada no processo. “O próprio delator fala que nunca conversou com ele (Denis) e que ele nunca fez exigências. Mas que em uma oportunidade um funcionário da Câmara teria feito exigência de valores e teria comentado que ia dar uma parte daquele dinheiro para o presidente. Ou seja, um ‘ouvi dizer’. Isso estraga a reputação de uma pessoa e não é prova. No processo, pedimos o arquivamento e estamos na expectativa da magistrada fazer essa primeira análise. “